Criticando o “Ciência sem fronteiras”

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BERNARDO SANTORO*

Ontem estava lendo um site de pós-graduação quando me deparei com uma interessante discussão: por que ciências humanas não são contempladas pelo programa federal “ciência sem fronteiras”? Na verdade, antes dessa pergunta, deveríamos perguntar o porquê da existência esse programa.

O “Ciência sem Fronteiras” é um programa do governo federal que concede bolsas para estudantes brasileiros de ciências exatas e biológicas estudarem no exterior, tanto através de estágios quanto através da realização de um curso completo de pós-graduação na área. Segundo o governo, o objetivo desse programa é aumentar a capacitação dos alunos e o diálogo com o exterior, possibilitando assim um aumento da qualidade da ciência produzida aqui.

Agora vamos sair da teoria e ir pra velha e feia prática.

É de conhecimento geral que o Brasil está em penúltimo lugar no ranking mundial de educação fundamental e que o ensino médio tem o mesmo nível. Isso cria um problema de formação básica que não pode ser consertado no exterior. A falta de adequada interpretação de texto, de treinamento de cálculo, entre outros elementos básicos de conhecimento faz com que o aluno padrão brasileiro não tenha nível para acompanhar uma turma de uma universidade de ponta do exterior,

Reportagem da Folha de São Paulo confirma isso, demonstrando que apenas 12% dos estudantes brasileiros do programa estão em universidades de ponta e que a maioria dos estudantes acabam indo para Portugal, mais especificamente Coimbra, que nos rankings mundiais está atrás da USP. Faz até sentido, já que o aluno padrão brasileiro não tem conhecimento de uma segunda língua, a ponto de reportagem do Estadão mostrar que o MEC vai afrouxar a exigência de conhecimento de língua estrangeira para participar do programa.

Mas se o estudante não domina idioma estrangeiro, vai fazer o quê no exterior? Estudar é que não. Turismo, talvez. Por isso o programa já tem o singelo apelido de “Turismo sem Fronteiras“.

A verdade é que somente o aluno de alto nível, com bom rendimento e ensino desde a base tem condições de estudar hoje no exterior. E o aluno com esse tipo de perfil é o de classe média e alta que estudou em boas escolas desde o ensino fundamental. Em suma, o “Ciência sem Fronteiras” é um programa governamental que transfere renda de pobres para ricos, o que, convenhamos, não é algo incomum.

E se tudo isso não fosse suficiente, reportagens da Folha e do Estadão ainda mostram que a carreira acadêmica desses alunos acaba sendo prejudicada com atrasos na conclusão de seus currículos, ou seja, prejudica a produção científica. O programa é um completo desastre.

Cabe ainda citar a questão da falta de bolsas para ciências humanas. O Brasil tem uma superprodução de ciências humanas e não precisa mais de estímulos. Os cursos de administração, direito e pedagogia, somados, correspondem a 40% dos alunos matriculados em universidades no Brasil. Temos mais faculdades de direito no Brasil do que em todo o resto do mundo somado. Administração e direito são, na prática brasileira atual, escolas de formação de burocratas, e digo isso na qualidade de advogado. Não precisamos de mais estímulos estatais nessa área, a não ser que o governo ache um absurdo que os estudantes de humanas fiquem sem turismo.

Esse programa, que está custando 3 bilhões de reais por ano, deve ser, por todos os motivos elencados aqui, tanto de natureza moral quanto utilitária, fechado imediatamente, para o bem dos cofres públicos do Brasil.

*DIRETOR DO INSTITUTO LIBERAL

 

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