Discurso de ódio e incitação à violência

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Um comentário que correu as redes sociais no dia de ontem foi feito pelo professor de filosofia da UFRRJ, Paulo Ghiraldelli, em referência à apresentadora conservadora do SBT, Rachel Sheherazade, de extremo mau gosto, que segue abaixo:

ghiraldellirachel

Eu tenho certeza que nem mesmo o tal professor acredita na justiça das suas palavras. Provavelmente é apenas um sujeito cheio de si, talvez entorpecido por alguma droga lícita ou ilícita no momento, que se deixou levar por um sentimento de ódio. A discussão que eu travarei aqui é: esse discurso é legítimo do ponto de vista liberal?

O prof. Walter Block, no livro “Defendendo o Indefensável”, publicado originalmente por este Instituto Liberal no Brasil, argumenta que injúria, calúnia e difamação, embora sejam práticas moralmente repugnantes, não deveriam sofrer sanções, pois ninguém seria dono da sua própria reputação ou da reputação alheia, e que transformar tais atos em criminosos seria um atentado à liberdade de expressão e até mesmo prejudicial, em longo prazo, para a credibilidade das pessoas, pois com essas condutas criminalizadas, a sociedade passaria a acreditar que qualquer besteira falada seria verdade, por não ter sido coibida (elas não contariam com a ineficiência do estado no combate a essas práticas).

A questão é que esse não é um caso de calúnia, difamação ou injúria.

Apenas esclarecendo, calúnia é acusar alguém injustamente de cometer um crime; difamação é acusar alguém injustamente de cometer um fato não-criminoso mas reconhecido pela sociedade como imoral; e injúria é um xingamento propriamente dito. No Código Penal, tais condutas se enquadram nos arts. 138 a 140.

O que o prof. Ghiraldelli fez não tem nada a ver com xingar ou acusar falsamente de criminoso ou imoral. O que ele fez foi incitar a prática de um crime contra outra pessoa. Ou seja, incitar a prática de iniciação de agressão, e iniciação da agressão é o parâmetro básico da ideia de crime no liberalismo.

Existe uma diferença bem grande, por exemplo, entre ser preconceituoso e incitar violência contra o que se tem preconceito. A primeira atitude, embora imoral, é passiva e não traz maiores repercussões práticas. Já a segunda ação tem a propensão de destruir a paz social e a ordem jurídica liberal, pois visa destruir o direito à vida e à propriedade privada de pessoas pacíficas.

Discursos imorais são legítimos, e até mesmo calúnias, difamações e injúrias, no limite, podem ser válidos, ainda que lamentáveis. Mas uma ação que busca incitar iniciação de agressão é injusta e deve ser coibida, ainda que prisão não seja o melhor remédio, dada a gravidade da pena privativa de liberdade, sendo certo que a multa e a indenização à atingida são medidas mais proporcionais ao delito cometido.

E para deixar essa diferença clara, destaco que mesmo no direito moderno o CP distingue a incitação ao crime dos crimes contra a honra supracitados. Incitação ao crime está no artigo 286:

Artigo 286 do CP: Incitar, publicamente, a prática de crime. Detenção: 3 a 6 meses.

No extremo, o prof. Ghiraldelli poderia até ser enquadrado como mandante do crime, caso ele viesse a ocorrer, embora essa já seja uma interpretação mais forçada, por questões de direito penal que não vêm ao caso explicar agora.

Portanto, dentro de uma visão liberal, cabe sim um combate ao ato nojento do prof. Ghiraldelli. Um liberal até deve tolerar o imoral discurso de ódio, mas nunca incitação à violência contra pessoas pacíficas.

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Bernardo Santoro

Bernardo Santoro

Mestre em Teoria e Filosofia do Direito (UERJ), Mestrando em Economia (Universidad Francisco Marroquín) e Pós-Graduado em Economia (UERJ). Professor de Economia Política das Faculdades de Direito da UERJ e da UFRJ. Advogado e Diretor-Executivo do Instituto Liberal.

4 comentários em “Discurso de ódio e incitação à violência

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    28/12/2013 em 2:59 am
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    “O que ele fez foi incitar a prática de um crime contra outra pessoa.”

    in·ci·tar
    1. Excitar (alguém) a (outrem) levar a efeito alguma coisa.

    Aí que reside o problema, não concordo que seja incitação. Parece mais um post irresponsável, em que ele deseja – veja bem o começo: VOTOS 2014 – que coisas ruins aconteçam a quem ele despreza no próximo ano. Pular de um desejo mórbido para incitação é problemático.

  • Avatar
    27/12/2013 em 9:08 pm
    Permalink

    Ué? Cade as feministas? Será que ele vai perder o emprego? Claro que não!

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    27/12/2013 em 2:03 pm
    Permalink

    realmente este tweet foi de péssimo gosto, mas não posso deixar de lembrar…
    Em um trecho do livro do Murray Rothbard, em que ele fala sobre liberdade de expressão ele faz o seguinte comentário, que tem relação com a incitação ao crime contra pessoas e propriedades. veja:

    ————————————————-
    O que falar, por exemplo, do “incitamento ao distúrbio” Em que o locutor é tido como culpado pelo crime de reunir uma multidão, que então provoca distúrbios e comete várias Ações e crimes contra pessoas e propriedades?
    No nosso ponto de vista “incitamento” só pode ser considerado um crime, se negarmos o livre-arbítrio e liberdade de escolha de todas as pessoas, e assumir que se A diz para B e C: “vocês, vão em frente e revoltem-se!”

    Então, de alguma forma, B e C estão inevitavelmente determinados a proceder e cometer o Ato nocivo. Mas o libertário, que acredita no livre-arbítrio, deve insistir que, embora seja imoral ou infeliz para A defender uma revolta, isso está estritamente no plano de incitação e não deve estar sujeito a penas legais.
    É claro que, Se A também participar da revolta, então ele também se torna um desordeiro e está igualmente sujeito a punição. Além disso, se A é um chefe de quadrilha, e como parte do crime, ele ordena seus seguidores: “você e ele, vão e roubem tal e tal banco” então é claro que A, de acordo com a lei de cumplicidade, se torna um participante ou mesmo líder do ato criminoso em si.

    Se incitação não deveria ser crime, então também não deveria ser “conspiração para iniciar”, porque, em contraste com o infeliz desenvolvimento das leis de cosnpiração, “conspirar”, isto é,concordar em fazer algo, nunca deveria ser mais ilegal que o ato em si.

    Como, de fato, pode “conspiração” ser definida exceto como um acordo entre duas ou mais pessoas…para fazer algo que você, o definidor, não gosta?

    http://www.youtube.com/watch?v=EvPvXLpf0kM
    —————————————————————————————————————————————-

    Eu não posso considerar um crime o direito da livre expressão de pensamento, até mesmo a incitação ao crime. incitar ao crime, não é um crime contra propriedade de fato. Acreditar que uma pessoa de fato vai ser estrupada por causa de um tweet, é um argumento Consequencialista, e você não levou em contra o livre-arbítrio e liberdade de escolha de todas as pessoas.

Fechado para comentários.

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