Iluminismo & Ilusionismo – Parte II —
Mônica Lustosa *
Outro malabarismo linguístico é a expressão “comunismo”, feito exclusivamente para ocultar a verdade. Trata-se de modelo social baseado num simulacro de igualdade, vez que seus defensores propagam uma sociedade sem classes. Por trás dessa retórica altruística, porém, há uma classe dominante, formada pelos burocratas que, através da força bruta, tomam posse dos bens públicos e privados.
Mas, a perfídia dos coletivistas não para por aí. Logo depois da Segunda Guerra, o Tratado de Potsdam dividiu a Alemanha entre os aliados vitoriosos. No setor oeste da zona de ocupação, foi constituída a República Federal da Alemanha, que ficou a cargo dos Estados Unidos, Inglaterra e França. No oeste, a União Soviética instituiu — ora, vejam! — a República “Democrática” Alemã. O regime que criou muros para impedir o êxodo da população, que fuzilava os que tentavam fugir e que era fortemente patrulhado pelo Exército Vermelho, achava-se no direito de cunhar a nação com o signo da democracia.
Atente-se, ainda, para a proeza dos ilusionistas nos Estados Unidos. Percebendo que a liberdade sempre foi um dos mais importantes fundamentos da cultura ianque, os defensores do estatismo apressaram-se em tatuar-se com o signo dos “liberais”. Simples assim. Como se tivessem o direito de revogar a teoria da gravidade com uma varinha de condão, os estatistas, roedores de glória, apropriaram-se do título de uma doutrina absolutamente contrária a sua e contra a qual se rebelou desde seu nascedouro.
E para não transformar este texto num almanaque da perfídia, conclui-se a série de exemplos com um discurso de Hitler que, como os demais estatistas, também queria o “bem dos pobres”. “Nós somos socialistas, nós somos inimigos do atual sistema econômico capitalista para a exploração dos economicamente fracos, com seus salários injustos, com sua indecorosa avaliação do ser humano de acordo com a riqueza e a propriedade em vez de sua responsabilidade e desempenho, e nós estamos todos determinados a destruir esse sistema sob todas as condições” (discurso de Primeiro de Maio de 1927).
Inimigos mentem. Só os amigos dizem the ugly truth, a verdade que precisa ser enfrentada para resolver um problema. Foi assim que, para resolver o problema econômico, Adam Smith acabou fundando a ciência econômica ao revelar a verdade como ela é: “não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro e do padeiro que esperamos o nosso jantar, mas da consideração que eles têm pelos próprios interesses”. Quando o iluminista escocês fez essa constatação, e escreveu sobre os sentimentos morais e a riqueza das nações, ele expôs o que de fato motiva os homens nas suas relações de produção, trabalho, comércio e consumo, e instrumentalizou os pensadores do seu tempo e da posteridade, tornando-se, assim como seu amigo David Hume, outro ícone do iluminismo escocês, um dos muitos pilares da civilização ocidental.
Marx, ao contrário, fez sua compilação de dados adulterados porque projetava na inversão da pirâmide social uma via de acesso ao poder político. Com efeito, uma rápida análise da técnica etimológica é o bastante para concluir que não há como justificar a adoção do vocábulo “capitalismo” para significar liberalismo econômico, pois, sendo “capital” bem de produção que, segundo o próprio Marx, pode ser de propriedade de particulares ou do Estado, o termo seria aplicável a ambos os modelos econômicos. Como disse Confúcio, “a sabedoria nasce quando se chama as coisas pelo seu verdadeiro nome”. Ora, não há razão para aceitarmos designações equivocadas, pois, de grão em grão, a galinha enche o papo, assim como de mentira em mentira, os estatistas conquistaram o mundo: primeiro, a imensa parcela dos trabalhadores; segundo, os intelectuais, tanto os que tinham interesses políticos quanto os que, posteriormente, foram imbecilizados pelo conforto da unanimidade; por fim, granjeou para seu lado os grandes empresários, do setor produtivo, financeiro ou comercial, que perceberam que, patrocinando os estatistas sanguessugas — com o perdão da redundância —, poderia colher generosos privilégios que só o Estado poderia ofertar, principalmente, políticas protecionistas que impedem ou dificultam extraordinariamente a sobrevivência dos seus concorrentes.
Se há momentos em que o passado pede algo ao presente, esse é um deles, pois a conivência com a perfídia dos coletivistas já levou muitos ao engano, e os meus amigos da praia não podem permanecer na ignorância, até porque o voto deles é só deles, mas o prejuízo é de todos.
* Mônica Lustosa é advogada, especialista em propriedade intelectual e diretora jurídica da HoodID – Registro de Direitos Autorais Online