A moralidade do impeachment

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Os defensores de Dilma insistem em dizer que o impeachment está sendo movido por sentimentos que extrapolam os argumentos jurídicos descritos no processo. Dizem que insatisfação popular não é motivo para o afastamento de um presidente. Fere a ordem democrática. O resultado das urnas confere legitimidade até ao pior governo. Todos esses argumentos não existiam antes do PT chegar ao poder. O que antes era visto como “grito das ruas”, passou a ser taxado de movimento golpista. A interpretação moral da política passou a ser outra.

O impeachment de Fernando Collor foi aberto no Congresso a partir dos indícios divulgados pela grande mídia de que ele era um dos beneficiários de um esquema de corrupção organizado pelo tesoureiro de sua campanha à presidência.

O impeachment de Fernando Collor ganhou as ruas a partir da insatisfação popular diante da grave crise econômica da época. Collor não estava sendo investigado pela Justiça. Não era réu em nenhum processo. A despeito disso, foi dado como culpado pela mídia, pelos sindicatos, pelos partidos de esquerda, pelos artistas e intelectuais. Todos pediram a queda do primeiro Presidente da República eleito pelo voto direto depois do regime militar.

O povo quis. O povo fez. Fernando Collor foi afastado. O tempo passou… Collor foi absolvido pelo STF e anos depois acolhido pelo PT como um dos mais importantes aliados.

Cá estamos.

O impeachment de Dilma Youssef foi aberto no Congresso a partir do parecer do Tribunal de Contas da União que diz, com todas as letras e números, que a Presidente da República fraudou as contas públicas. O agravante: Em ano eleitoral. O mesmo TCU fez questão de comparar as pedaladas de Dilma com as pedaladas de seus antecessores, evidenciando a absurda discrepância de procedimento e de volume de dinheiro. Dilma fraudou as contas públicas durante dois anos ininterruptamente, num volume que chega a R$ 60 bilhões. Fraudou para enganar o povo. Fraudou para se reeleger.

O impeachment de Dilma Youssef é exigido nas ruas por tudo o que essa fraude envolve. A mentira: Dezenas de milhões de brasileiros votaram nela crendo que a economia estava bem. Os efeitos: Inflação, desemprego e recessão. A arrogância: Uma presidente mentirosa, irresponsável e complacente com a corrupção que engrossa a voz para chamar de golpista todos cidadãos comuns que se manifestam contra seu governo que, convenhamos, não tem nada que mereça elogios.

Uma pergunta: Por que um cidadão comum, assalariado ou pequeno empresário, não pode fazer seu próprio julgamento moral sobre um governo?

Apenas na última semana, veio a público a gigantesca fraude do Programa de Reforma Agrária, em que 578 mil beneficiários (cerca de 1/3 do total) são servidores públicos, políticos, empresários e até pessoas já falecidas; o ex-presidente da 2° maior empreiteira do país disse, em depoimento, que dos R$ 20 milhões que doou para a campanha de reeleição de Dilma, metade se referia a propina; sem qualquer pudor, Lula, em nome do governo, tenta comprar votos contra o impeachment oferecendo cargos e dinheiro. Soma-se a isso literalmente dezenas de documentos, gravações e delações dos próprios envolvidos detalhando esquemas de corrupção diretamente relacionados ao poder executivo, no mínimo, sob a complacência da presidente.

Diante desses fatos, a sociedade brasileira não teria o direito de pedir a saída de Dilma?

Duas semanas atrás, o Primeiro-ministro da Islândia renunciou dois dias depois de ser noticiado que ele havia mentido sobre sua participação numa empresa sediada noutro país. Não estava sendo acusado de corrupção. Apenas foi revelado que ele mentiu. Por uma interpretação moral do fato, a mesma sociedade que o elegeu foi para a rua pedir sua renúncia. Renunciou.

Nietzsche diz que não existe moral, mas a interpretação moral dos fatos. Todas as pessoas que defendem Dilma fizeram elas mesmas suas interpretações morais sobre governos que antecederam os do PT. Foi a interpretação moral dos fatos que fez com que o Partido dos Trabalhadores protocolasse nada menos do que 50 pedidos de impeachment entre 1990 e 2002. Diante disso, por qual razão a sociedade hoje, agora, não pode fazer sua interpretação moral da conduta desse governo? Não seria uma imoralidade a Presidente da República tentar nomear para a Casa Civil uma pessoa acusada de tantos crimes, como Lula? Não seria uma imoralidade a Presidente da República receber em seu palácio um grupo terrorista que ameaça, aos gritos, invadir as propriedades de todos que venham a votar por seu impeachment? Não seria uma imoralidade o ministro da Justiça e o Advogado-geral da União liderarem a campanha de desqualificação do juiz que está, pela primeira vez na história do Brasil, colocando na cadeia grandes empresários e políticos corruptos?

Outro argumento contra o processo de impeachment é o de que o Presidente da Câmara, Eduardo Cunha, por causa dos indícios de corrupção que pesam sobre ele, não tem moral para aceitar um pedido de afastamento de Dilma. No entanto, as mesmas pessoas que dizem isso entendem que ele tem moral suficiente para aceitar o pedido de impeachment do vice-presidente da República, Michel Temer.  Que conceito de moralidade é esse?

Os fatos:

O pedido de impeachment contra Dilma Youssef sustenta-se única e exclusivamente na fraude fiscal comprovada pelo Tribunal de Contas da União. Cabe ao Congresso cumprir a lei ou rasgá-la.

O desejo de impeachment que move a grande maioria da sociedade brasileira sustenta-se na intepretação moral de que uma pessoa tão mentirosa e tão complacente com a corrupção não pode ocupar o cargo mais importante do país. Cabe ao Congresso acatar esse desejo ou ignorá-lo.

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João Cesar de Melo

João Cesar de Melo

É militante liberal/conservador com consciência libertária.

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