O “real” perigo do dólar
por MARIANO ANDRADE*
Os brasileiros estão assustados – e com razão – com a disparada do dólar frente ao real. O resultado – termos ficado 50% mais pobres em moeda forte em tão pouco tempo – é uma enorme frustração, derretendo a confiança dos agentes econômicos e adiando certos planos para algumas famílias. A causa – o desgoverno do PT e a irresponsabilidade de Lula, Dilma, Mantega e afins na condução da economia – segue presente e por isso não tem havido qualquer alívio no mercado.
Orçamento deficitário, críticas a Levy, aumento de impostos, tentativa de reedição do roubo mascarado em CPMF e outros assuntos têm sido abordados diariamente pela mídia e todos seguiremos acompanhando o desenrolar. Por ora, nada tem contribuído para que o real se fortaleça.
Há, no entanto, um risco novo neste movimento da moeda: o enorme spread cobrado pelos participantes do mercado de câmbio. Bancos, cartões de crédito e casas de câmbio vêm praticando taxas muito superiores à do mercado spot. Nada que não tenhamos visto no passado, mas desta vez há um tempero especial que torna a prática mais preocupante…
… O IOF em operações de câmbio – com a idiótica alíquota instituída há alguns anos para proteger nossa balança de pagamentos da valorização acentuada do real (veja você, leitor!) – permanece vigorando. Isso mesmo, nesta crise cambial vigora uma tributação cujo objetivo é evitar que o real se fortaleça muito. Ou seja, o governo é o primeiro a incentivar o spreadentre o câmbio oficial e o câmbio ao qual os agentes conseguem converter seus reais em dólares. Esse efeito é cumulativo, e ao final da cadeia o câmbio efetivo é 20% superior ao spot, nível bastante preocupante.
A existência do IOF sobre operações de câmbio ataca frontalmente a ideia de conversibilidade da nossa moeda e do livre fluxo de capitais, uma vez que a alíquota pode ser elevada intempestivamente resultando em tributação abusiva de patrimônio (leia-se confisco) para aqueles que desejem migrar parte de sua poupança para moeda forte. Portanto, é natural que – nesta agenda extemporânea de aumentar impostos em meio a uma recessão – os participantes do mercado queiram acumular dólares “enquanto o IOF é só 6.38%”, pensam. Gera-se uma espiral viciosa.
O perigo de termos duas, três ou mais taxas de câmbio concomitantes remete aos sombrios anos 80, quando o “black” negociava com prêmio de 100% sobre o “oficial”, e quando era necessário apresentar bilhete de viagem internacional para comprar dólares no preço spot, ainda que em volume limitado. Este tipo de configuração destrói qualquer credibilidade acerca do valor da moeda local, prejudicando poupança interna e comércio internacional, e ajudando a enterrar de vez a economia. Basta ver o que aconteceu na Venezuela e na Argentina.
O “black” Argentino tem o eufemístico nome de “blue”, e o ágio do dólar neste mercado paralelo mantém-se em 50% ou mais, flertando com níveis mais altos em momentos de incerteza. A situação na Venezuela – com sistema de três câmbios e zero de liberdade social /econômica – é tão periclitante que nem há uma cor que possa apelidar apropriadamente o mercado negro: o dólar papel vale mais do que 100 vezes o dólar oficial. O governo prepara novas cédulas de bolívares, já que a maior delas atualmente em circulação compra apenas 14 centavos de dólares no mercado negro.
É imperativo que o governo elimine a incidência de IOF nas operações de câmbio de uma vez por todas. A mensagem deve ser que o governo tem confiança em sua moeda, em sua capacidade de preservar o poder de compra do (baixo) estoque de poupança do país. Não se trata de zerar a alíquota, mas sim de extinguir o tributo. Sonho distante? Provavelmente, já que cortar impostos e/ou gastos não está na agenda de nenhum governo que tenha passado por estas terras tupiniquins.
Idealmente, permitir-se-ia a qualquer cidadão brasileiro a abertura de contas denominadas em dólares ou euros nos bancos comerciais, com o câmbio sendo efetuado às cotações oficiais. Desta forma, o poupador teria acesso à conversibilidade ao preço spot da moeda estrangeira, mas correndo o risco do câmbio flutuante e da saúde financeira do banco escolhido. Perdemos a chance de fazer este movimento no boom das commodities e agora isso parece um sonho distante… mais um…
Quem sabe, no entanto, tudo isso seja pura bobagem, apenas o desejo de um observador “coxinha” que quer garantir sua viagem anual a Miami a um custo módico. Afinal, Argentina e Venezuela estão bombando!